Uma intervenção federal deformada à luz da Constituição Federal, por Frederico Cortez
A Constituição Federal de 1988 em seu art. 84, X versa sobre a competência privativa do Presidente da República quanto à decretação e execução de intervenção federal. No caso do decreto da intervenção federal no Rio de Janeiro, há que se destacar que tal ato é de natureza civil contornada de militarismo, posto que o art. 2º é claro quanto à nomeação de um General do Exército brasileiro para o cargo de interventor. No mais, no mesmo artigo, o seu parágrafo único reforça que o cargo de interventor é afeito à “natureza militar”.
O princípio federativo do Brasil está elencado no art. 18 da CF/88, dispositivo legal esse que preconiza a autonomia entre os entes federativos da nação na forma determinada pela Carta Magna. Com a intervenção decretada nesta sexta-feira (16), pelo presidente Michel Temer, há uma redução da autonomia político-administrativo do estado fluminense.
Assim, o caput do art. 3º determina que as atribuições do interventor serão as mesmas previstas no art. 145 da Constituição do Estado do Rio de Janeiro. Destaque-se que tal coluna legal estadual está ligada à competência privativa do Governo do Estado e que tais incumbências legais são de cunho administrativo do governante, no exercício do seu poder discricionário e que não há nada específico no que pese ao termo “segurança pública”. Esta, é parte do decreto interventivo quando mencionado o “Título V” da constituição estadual. No geral, as atribuições do interventor são genéricas, sendo reflexa ao poder do governante durante o seu mandato. Assim, há uma incerteza quanto ao real poder do interventor no estado do Rio de Janeiro.
Ponto importante e questionável é o modo do nascimento de tal decreto, posto que pelas informações do Governo federal, o pedido interventivo foi de origem do chefe do executivo estadual do Rio de Janeiro. Nesse sentido, o art. 36 da CF/88 especifica dois tipos de intervenção: intervenção provocada por solicitação (primeira parte do inciso I, do art. 36 da CF/88) e a intervenção requisitada (segunda parte do inciso I, do art. 36 da CF/88).
No caso da intervenção por solicitação (primeira parte do inciso I, do art. 36 da CF/88), a Constituição é clara que somente cabe tal provocação por parte do Poder Legislativo ou do Poder Executivo coacto ou impedido, para fins de “garantir o livre exercício de qualquer dos Poderes nas unidades da Federação.” (art. 34, IV da CF/88), o que não é o caso do estado fluminense.
No mais, soma-se, que o ato presidencial de decretação da intervenção federativa no RJ elenca, no seu §2º do art. 1º, a sua motivação que está alinhada ao inciso III, do art. 34, vejamos: “III- pôr tremo a grave comprometimento da ordem pública”. Da forma como foi editado tal decreto interventivo, depreende-se que foi por provocação do atual governador do RJ, sendo que a sua fundamentação está enraizada na espécie de intervenção espontânea do Presidente da República, pois somente este é detentor de tal poder privativo (art. 84, X, da CF/88).
A espécie de intervenção espontânea ( o presidente da república age de ofício) é de cunhou doutrinária, uma vez que não estando tal intervenção enquadrada pelo inciso I do art. 36 da CF/88, resta por exclusão a competência exclusiva do Presidente Michel Temer para decretar a intervenção federativa espontânea apoiada na dicção do inciso III, do art. 34 da CF/88 (“PÔR TERMO A GRAVE COMPROMETIMENTO DA ORDEM PÚBLICA).
Sendo assim, ao meu sentir, resta inconstitucional o meio pelo qual tal intervenção federal foi gestada por meio do Decreto nº 9.288/18, desobedecendo de forma clara e direta o preceito constitucional, padecendo assim de uma inconstitucionalidade formal. Ou seja, acertaram na receita do bolo, mas erraram na sua fôrma.
Artigo publicado no facebook em 18/02/2018 sob o título:UMA INTERVENÇÃO FEDERAL DEFORMADA À LUZ DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988